05/04/1970 - Amistoso - Internacional 0 x 1 Uruguai

AMISTOSO - INTERNACIONAL 0 X 1 URUGUAI
Data: 05/04/1970
Local: Beira-Rio - Porto Alegre (RS)
Renda: Cr$ 170.135,50
Juiz: Ramón Barreto (URU), auxiliado por Luís Rodríguez Candales (URU) e Héctor Rodríguez (URU).
Gol: Fontes 37’/2 (U).
INTERNACIONAL: Gainete; Édson Madureira, Pontes, Valmir Louruz e Jorge Andrade; Paulo César Carpegiani e Carbone; Sérgio Galocha, Bráulio (Valdomiro) Claudiomiro e Mosquito. Técnico: Daltro Menezes.
URUGUAI: Mazurkiewicz; Ubiñas, Sandoval, Matosas e Brunel; Lamas e Esparrago; Losada, Cubillas (Fontes), Manero e Bareño. Técnico: Juan Honberg.

O Inter foi aguerrido, mas não evitou a derrota para o Uruguai.
Fonte: Placar
UM PROFESSOR DE BOLA: O URUGUAI
Apesar de não ter centroavante, o Uruguai mostrou que pode ganhar a Copa
O Uruguai veio domingo ao Brasil, ganhou com certa facilidade do Internacional de Porto Alegre (apesar de ter sido só por 1 a 0) e deixou no Estádio Beira-Rio uma prova de seu grande talento, jogando sem quatro titulares (Montero Castillo, Rocha, Caetano e Ancheta) e num estilo completamente diferente do que usará para ganhar a Copa.
No México, o Uruguai usará o sistema tático ideal, o mesmo que deslumbrou o povo de Montevidéu na terça-feira passada, dia 31, quando derrotou o Peru por 2 a 0.
Ele tem tudo para ganhar de qualquer adversário, europeu ou sul-americano, com líbero ou sem líbero, simplesmente porque o Uruguai não deixa jogar, está em toda parte do campo, tem uma malícia e uma facilidade fora do comum para “esconder” a bola, além de uma valentia própria dos heróis
O jogo do Uruguai ficou quase sobrenatural desde que ele conseguiu o impossível: adaptar os métodos e táticas europeus ao talento do futebol sul-americano. Mas aparentemente é um jogo simples:
Os dois laterais, Luis Ubiñas e Angel Brunell (que está jogando no lugar de Caetano, suspenso por doping), avançam constantemente até a área, mas com muito mais eficiência do que, por exemplo, Carlos Alberto e Marco Antônio. Ubiñas e Brunell, quando avançam, são atacantes de verdade, que fazem tabela, chutam a gol, cruzam, cabeceiam e driblam.
Eles atacam despreocupados: Montero Castillo se encarrega de cobri-los ao ficar na altura da intermediária adversária. E Castillo ainda protege os dois zagueiros de área, Atilio Ancheta e Roberto Matosas. Seu papel é quase de um líbero à frente da defesa: dá o primeiro combate e tenta recuperar as bolas perdidas pelos atacantes.
Mas o papel mais importante do sistema uruguaio é o de Ildo Maneiro. Ele é o quinto atacante, com a função de estar sempre presente no ataque quando o time avança e de se recuperar velozmente assim que o time perde a bola.
Quase todos os jogadores têm rígidas funções, menos Luis Cubilla. Seu talento, sua malícia (lembra os maiores “catimbeiros” do futebol brasileiro) e sua inteligência permitem que ele tenha uma certa liberdade (de nunca precisar combater o adversário, por exemplo). Cubilla, porém, está sempre bem colocado e pronto para receber a bola.
O resto do time só tem a liberdade de Cubilla na hora dos contra-ataques. Nessa hora tudo é permitido. Até mesmo um dos zagueiros de área pode sair para o ataque e transformar-se num ponta-direita ou em um centroavante. Imediatamente sua posição será coberta por um dos homens do meio-campo ou por um atacante.
Quando se defende, o Uruguai prova uma velha teoria: não se pode dar nenhuma oportunidade ao adversário. O combate começa a ser feito a partir do campo inimigo. principalmente pelos dois pontas — Julio Losada (ponta-direita) e Ruben Barco (ponta-esquerda). A seguir forma-se uma linha de três homens na intermediária: Alberto Gómez (substituto de Pedro Rocha, que está contundido). Ildo Maneiro e mais atrás, Castillo. Na última linha estão os quatro zagueiros, Atilio Ancheta, um deles fica na sobra. E no gol, orientando a defesa ou incentivando o ataque, fica Ladislao Mazurkiewicz, considerado o melhor goleiro do mundo no momento.
Mas o que mais impressiona no Uruguai é o alto nível profissional de seus jogadores, a compenetração de cada um em cumprir sua função dentro do time, a disciplina tática e a organização de jogo. Como responsáveis por isso podem ser apontados dois técnicos brasileiros: Zezé Moreira, ex-técnico do Nacional e Osvaldo Brandão, técnico do Peñarol.
O Uruguai é mesmo um perigo porque seu time ainda está em formação. E com dois problemas:
1) Caetano (lateral esquerdo) e Córtez (armador), dois jogadores muito importantes, foram suspensos por doping — o exame foi feito depois do último jogo entre Peñarol e Nacional. A pena inicial aplicada pela FIFA foi suspensão, mas o tempo só será determinado pelo julgamento. O pior é que os outros convocados ameaçam uma greve geral se Caetano e Córtez não forem perdoados.
2) O ataque não tem centroavante e não há nenhum centroavante ideal, no momento, jogando no Uruguai. Esse problema é tão real que o jornal El Diario está promovendo um concurso para que o povo eleja o homem-gol. Por enquanto, o ganhador é Pedro Álvarez. um ponta-de-lança baixinho mas muito hábil. Ele está com 1.052 votos.
OUTRO JOGO DESSA INCRÍVEL SELEÇÃO
Domingo, contra o Internacional, no Beira-Rio, o técnico Juan Eduardo Hohberg mostrou a nova arma de sua seleção: versatilidade. Ele transformou completamente a tática ofensiva que derrotou a Seleção do Peru em um esquema mais cuidadoso, com o qual pretendia apenas empatar ou vencer de pouco (como venceu, por 1 a 0).
A transformação de seu esquema deveu-se, também, à ausência de alguns titulares, que jogaram em Montevidéu, mas que foram poupados ou substituídos por reservas com características bastante diferentes.
Alfredo Lamas, que entrou no lugar de Montero Castillo, é um jogador que disputa menos a bola; Sparrago, que ficou com o lugar de Gómez, é menos ofensivo.
Assim, o Uruguai empregou um sistema de paciência, esperando uma falha do adversário para conseguir o gol que seria o da vitória. Essa é uma teoria dos próprios jogadores da Celeste: ganhar de um ou de seis representa a mesma coisa. Por isso, o importante é não dar oportunidade ao adversário de fazer gol.
Com essa teoria, os uruguaios transformaram a posição em “W" de seus cinco atacantes (os dois pontas bem abertos, o ponta-de-lança bem à frente e os dois meias indo e voltando) para uma posição muito mais defensiva (o meia Maneiro entrando bem menos e Sparrago, bem mais preso em seu campo do que foi Gómez, no jogo contra o Peru).
Mas, mesmo assim, enquanto contaram com Luis Cubilia no centro do ataque, conseguiram criar boas oportunidades, como uma de cabeça que foi na trave, do próprio Cubilla. Depois, com a entrada de Fontes, a característica de paciência da Celeste foi marcante. E Isso só vem provar que realmente falta um ponta-de-lança no Uruguai.
O BOM JOGO DESSE INCRÍVEL INTERNACIONAL
A Seleção Brasileira procura adversários para jogos-treinos. Por que então não jogar contra o Internacional de Porto Alegre?
O Inter, mesmo perdendo domingo para a Seleção do Uruguai, mostrou que é um dos melhores times do Brasil. E, antes de perder, havia derrotado o Peru (3 a 0), que desclassificou a Argentina da Copa do Mundo, e o Nacional de Montevidéu (2 a 0), um time invicto há 44 jogos. Se o Internacional é um bom adversário para seleções como as do Uruguai e do Peru, por que não seria para a do Brasil?
O Inter mostrou, mesmo sem chegar muito no gol de Mazurkiewicz, ser um time que disputa o jogo no campo inteiro. Tem raça e alguns jogadores de grande talento como Pontes, Carbone, Sérgio e Claudiomiro.
Contra o Uruguai, todo o time pareceu sentir muito a falta de Dorinho, um meia que sabe acalmar o jogo nas horas mais difíceis e que impulsiona com inteligência as "pontadas" de Sérgio e Claudiomiro.
Por 81 minutos, o Inter resistiu a uma seleção da categoria do Uruguai. Por quanto tempo resistiria à Seleção Brasileira, no Beira-Rio?
O Inter seria um bom teste para a Seleção Brasileira, na falta de adversários europeus. É um time que joga duro, mas sem maldade, que ocupa o campo com seus jogadores muito bem distribuídos, donos de um futebol valente (talvez motivado pela sua enorme torcida) que certamente colocaria a Seleção Brasileira numa situação bastante delicada. E isso permitiria a Zagalo e a torcida avaliar em que ponto está nossa Seleção.
Fonte: LAURENCE, Michel; MOTTA, Manoel. Um professor de bola: o Uruguai. Revista Placar, n. 4, 10 abr. 1970, p. 12-13.

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