Infelizmente essa prática, muito prejudicial do esporte local, e mais que isso ao nosso renome de cavalheiros, tirou, senão todo, ao menos grande parte do brilho da emocionante peleja que deveria marcar um verdadeiro acontecimento para o mundo esportivo de Porto Alegre, que já não comporta mais essas cenas de que foi teatro ontem o campo do valoroso contendor do campeão de 1919 e das quais participaram não só os assistentes mais irritadiços, mas também os players que a todo momento sa rebelavam contra as decisões do juiz, que, diga-se de passagem, atuou com toda a correção, tanto maior quanto as constantes [...] do público não lhe deixavam a necessária calma para agir nos momentos em que sua intervenção se fazia necessária para a boa ordem do jogo.
A constante repetição de tais fatos fatalmente arredará dos nossos grounds a assistência ordeira e que ali comparece tão somente para apreciar a partida sem o ânimo reconcebido de prejudicar a sua boa marcha, como aconteceu ontem e como acontecerá amanhã, se os dirigentes do foot-ball local a tomarem enérgicas providências para reprimí-los. Do contrário, as nossas praças de esporte se converterão em rinhedeiro, onde os resistentes apaixonados, sobreacorçoarem as rixas em campo, dela participarão, com resultados tristes para todos, pois os mais exaltados não titubearão em lançar mão de violências de consequências funestas, como ontem quase aconteceria se não fora a intervenção pacífica de cavalheiros ordeiros.
Urge que a Associação Porto Alegrense tome medidas imediatas no sentido de coibir que tais fatos se reproduzam, sob pena de amanhã os nossos jogadores só terem como assistentes as arquibancadas mudas e incômodas das nossas praças de esporte.
A culpa de tudo isso cabe menos ao público que aos dirigentes do football local e aos jogadores, mas para estes há penas severas que deverão ser aplicadas quanto antes, pois que mais tarde talvez não venha a tempo.
Aí ficam os nossos reparos e que eles sirvam ao menos de aviso àqueles que entre nós dirigem o football, aos quais pedimos que ponham um paradeiro tais acontecimentos, sempre lamentáveis e que tanto depõem contra os nossos foros de sportmen que precisam ser banidos, mau grado as disposições em contrário de certos grupos que colocariam acima de tudo a vitória do seu clube, pouco se reocupando com o modo porque essa vitória venha a ser alcançada.
A principal é que ele se verifique os meios e os recursos para a sua obtenção vem em segundo plano.
Dito isso, passemos ao match.
Precisamente às 16 horas e 20 minutos os dois valentes contendores deram centrada em campo, vindo na frente o team do Grêmio 6 e a seguir o do Internacional, sendo ambos recebidos por uma prolongada salva de palmas e urrahs por parte da asssistência, que ansiosamente aguardava o início do esperado encontro entre os dois velhos rivais de tantas pelejas memoráveis.
Após o bate bola "in goal", o referee chamou a postos os jogadores, que assim se colocaram:
INTERNACIONAL
Travi
Bello - B. G.
Só - Bitú - Rosario
Gil - Genny - Kluwe - Bento - Maia
GRÊMIO
Teixeira
Assumpção - Py
Moreno - Dorival - Meneguine
Bruno - Ramão - Lagarto - Maximo - Gertum
A sorte favoreceu o campeão do ano passado que escolheu o retângulo que fica aos fundos do ground, passando o Internacional a defender o goal à entrada.
Deu a saída o center do quadro Iocal, Kluwe, que passou a bola a Bento.
Estava iniciada a peleja que prometia revestir-se de grande animação, não só devido ao valor dos dois adversários que frente a frente se encontravam aparelhados para alcançar a vitória final, como também porque as arquibancadas e adjacências do campo uma multidão nervosa os animava com os seus aplausos, incitando-os à luta.
A primeira investida dos companheiros de Kluwe, o esforçado capitão da falange do campo dos Eucalitpos, foi interceptada pelos forwards do team de Lagarto, que de início carregaram com segurança contra o posto de Travi, ameaçando vencê-lo.
Toda a defesa do Internacional estava a postos, mas a linha dianteira gremista não lhe deu trégua, antes foi a multiplicar-se para evitar que o seu último reduto fosse abatido pela impetuosidade das arrancadas de Lagarto, Ramão, Bruno, Gertum e Máximo, o esplêndido quinteto dos Moinhos de Vento, que ontem se mostrou na altura do conjunto gremista.
O jogo agora assume proporções de um grande match entre campões, que foram todos os 22 players que ontem mediram forças na disputa de título sempre ambicionado de campeão de 1920.
O conjunto do Grêmio desenvolve melhor jogo que o seu adversário, que se mostra algo desarticulado. É que as primeiras avançadas do team visitante são de molde a infundir receio, tal sua impetuosidade posta à prova logo de início.
O centre-half internacionalista Bitú desenvolve uma atividade digna de elogios e sua presença se nota nos momentos mais difíceis para o seu team.
Com ele, Bello forma o pivot da defesa local que trabalha incansavelmente, procurando frustar os ataques gremistas, que são insistentes e bem conduzidos por Lagarto, que ontem voltou a sua antiga posição de ponteiro da linha atacante do seu quadro e onde atualmente não encontra competidor em Porto Alegre.
A ele deve o team visitante a bela atuação da sua linha de forwards que na primeira fase do jogo dominou o adversário, pondo em sérios embaraços a sua defesa, que por fim foi vencida duas vezes consecutivas.
A linha do Internacional, com compreendendo a violência do ataque dos companheiros de Lagarto, não se descuidou da defesa e passou a reforça-la, procurando arrebatar a pelota dos pés dos atacantes e ensaiando algumas investidas que Moreno, Dorival e Meneguine inutilizavam.
Parecia a todos que o posto de Travi não tardaria a cair e assim aconteceu, pois arrematando uma bela investida de seus companheiros bem conduzida por Gertum na ala direita, Ramão, que ontem passou para a meia-esquerda, burlou a segura vigilância de Travi, adjudicando para a sua equipe o primeiro ponto, que a assitência recebeu com grandes aplausos.
O gol de Ramão foi indefensável, pois o mignon player gremista, aproveitando-se de um passe da direita, qua provocou uma melange nas imediações do retângulo de Travi, arremessou a bola contra o lado esquerdo da cidadela contrária, vazando-a pela primeira vez, depois de grande esforço.
Posta a bola no centro e dada a saída novamente por Kluwe, os seus companheiros tentam uma avançada pelo meio do campo, mas a defesa do Grêmio, sempre vigilante, inutiliza esse ataque, mandando a pelota para os seus forwards, que voltam de novo a assediar o posto de Travi, que se destaca desde logo, como um keeper de grande valor.
O trabalho de Bello, Bitú e Rosario é estafante ante o assédio do adversário que a todo o momento procura o último reduto internacionalista.
A linha local, de quando em quando consegue transpor a primeira defesa visitante, mas Jorge, sempre atento, tira a bola ao adversário, enviando-a para os seus dianteiros, que voltam a atacar com a mesma insistência dos primeiros minutos de jogo.
Num dado momento, toda a linha de ofensiva gremista se acerca do gol de Travi, quando um backs locais comete um hand, que o juiz puniu, mandando bater o pênalti contra o Internacional.
Pela assistência, simpática ao team de Bello, passa um calafrio, um quase torpor.
É que a pena aplicada ao quadro da sua predileção constitui o máximo de todas quantas se há imaginado nas regras do foot-ball e que quase sempse se traduz em um ponto para a equipe que por ela é favorecida.
Foi o que aconteceu, pois o pênalti, muito bem tirado por Gertum, converteu-se em segundo gol para o Grêmio.
Recomeçado o jogo, não sem grande dificuldade, pois o público invadiu o campo, procurando anular a decisão do referee, o Internacional avança contra o terreno inimigo.
Os atacantes, Genny, Kluwe e Bento, a todo o transe ameaçam o gol de Teixeira enviado contra ele violentos tiros que o goleiro gremista apara bem.
Os ataques agora se revezam; ora é o Grêmio que ataca, ora é o seu adversário que carrega procurando desfazer a diferença alcançada pelos visitantes.
Estes não contentes com os pontos obtidos querem aumtentar o score, no que são impedidos pela defesa Iocal, muito bem auxiliada por Bello e Bitú, principalmente o primeiro que se mostra seguro nas suas rebatidas.
Travi tem ocasião de realizar belas defesas que os assietentes aplaudem com entusiasmo.
De parte a parte, a animação é grande e nenhum dos contendores dá sinal de fadiga, embora já tenha decorrido quase toda a primeira parte do match, pois momentos depois o referee dava por terminado o half-time com o seguinte resultado:
GRÊMIO - 2 gols
INTERNACIONAL - 0 gols
Após o descanso regulamentar, os teams voltaram ao campo.
Deu saída para o Grêmio que logo entrou a atacar, mas sem resultado, pois a defesa adversária agora mais firme que no início do match, desfaz as arremetidas dos companheiros do capitão Lagarto, muito bem conduzidos.
São tirados diversos corners e ambos os lados, mas o score do primeiro tempo sofreu alteração.
As defesas adversárias trabalham com afinco, inutilizando as avançadas contra o seu campo.
Nesse trabalho, destaca-se do lado do Grêmio o half-right Meneguine, que se multiplica utilizando o jogo de Maia e Bento, na esquerda. Do bando local, Bitú e Rosario não dão tempo a que Maximo e Gertum se aproximem do gol de Travi.
Registra-se uma pressão dos players do Internacional que Py e Moreno desfazem.
A seguir os locais investem contra o gol de Teixeira, que produz uma boa defesa, salvando o seu posto.
Depois de ligeiros ataques de parte a parte, Bento, aproveitando-se da má colocação de Assumpção e Py, que se achavam muito na frente, corre corre contra o retângulo de Teixeira, conseguindo alcançá-lo, sem que aqueles dois backs conseguissem conter a sua corrida. Parecia iminente a queda do gol gremista, quando Teixeira sai rapidamente ao encontro do adversário, conseguindo arrebatar-lhe a bola. Foi o mais belo feito do goleiro gremista e que lhe valeu uma prolongada salva de palmas.
Os atacantes internacionalistas insistem no campo do adversário, procurando desfazer a vantagem deste e houve um momento em que a todos parecia realizado o desejo do quadro de Kluwe. Foi quando o juiz puniu um pênalti contra o Grêmio.
Dado o tiro penal contra o posto de Teixeira, este com uma agilidade colossal aparou a bola que foi novamente alcançada pelo adversário.
Dada a confusão que se estabeleceu na porta do gol de Teixeira, não nos foi possível apreciar o que ali se desenrolou, mas o juiz mandou tirar o kick-off.
Os forwards do Internacional insistem na defensiva, dando muito que fazer à defesa do team dos Moinhos de Vento que trats de interceptar a passagem do quinteto internacionalista. Este quer vencer a guarda de Teixeira, mas não o consegue, porque ou os seus tiros finais são mal arrematados ou a defesa contrária não lhe deixa tempo para alvejar a meta final.
Agora o jogo vai descambando para a brutalidade, dando lugar a qua o referee puna a todo o momento faltas cometidas pelos dois contendores.
O público anima os jogadores à prática do jogo bruto, vendo-se a todo o instante [...] violentos empurrões e outras faltas que o juiz pune, observando os faltosos.
Depois de um ataque do Internacional, Py como recurso de defesa manda a bola o corner, que tirado por Gil deu em resultado um pênalti que o juiz marcou contra o Grêmio.
Bateu o pênalti o back Bello, que mandou a bola contra o posto direito do goal de Teixeira.
Registra-se nova invasão do público. Desta falta, o juiz não conseguiu dar início novamente ao jogo, pois os invasores não atendiam ao trilhar do apito.
Em vista de tal normalidade, e já noite, o referee deu por terminada a luta, da qual saiu vencedor o Gremio pelo score de 2 gols a zero.
O match terminou quando faltavam 25 minutos para o final regulamentar.
- No match dos segundos teams venceu o Internacional por 4 gols a 0.
O movimento técnico da pugna foi este:
GRÊMIO
| 1º tem. | 2º tem. | Total |
Corners | 0 | 2 | 2 |
Hands | 3 | 1 | 4 |
Fouls | 4 | 1 | 5 |
Off-sides | 4 | 3 | 7 |
Pegadas | 2 | 3 | 5 |
Gols | 2 | 0 | 2 |
Pênaltis | 0 | 2 | 2 |
INTERNACIONAL
| 1º tem. | 2º tem. | Total |
Corners | 2 | 2 | 4 |
Hands | 5 | 2 | 7 |
Fouls | 3 | 2 | 5 |
Off-sides | 1 | 0 | 1 |
Pegadas | 5 | 2 | 7 |
Gols | 0 | 0 | 0 |
Pênaltis | 1 | 0 | 1 |
Fonte: A Federação (RS), 03/05/1920, ano 1920, n. 102, p. 2. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/388653/43711. Acesso em: 12 out. 2023.
Reune-se, hoje, no lugar do costume, a diretoria da Associação Porto Alegrense de Desportos que vai tratar dos fatos ocorridos domingo no match Internacional versus Grêmio, fatos esses que obrigaram o referee a suspender a pugna, quando faltavam 25 minutos para terminar.
A medida que a diretoria vai tomar, de acordo com os estatutos e a continuação do match, isto é, jogar os 25 minutos restantes, em campo neutro e sem assistência.
Daremos, amanhã, os pormenores dessa sessão.
Fonte: A Federação (RS), 04/05/1920, ano 1920, n. 103, p. 6. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/388653/43723. Acesso em: 12 out. 2023.
Causou desagradável impressão nos meios esportivos, a decicão de ontem da diretoria da Associação Porto Alegrense de Desportos, puníndo "players" que nas ocorrênias do match de domingo, foram agredidos e, portanto obrigados a reagir.
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Daremos, amanhã, os pormenores da sessão da Assoclação.
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INTERNACIONAL VERSUS GRÊMIO - No ground do Internacional, prosseguirá, domingo, às 9 1/2 horas, o match entre os primeiros teams do Grêmio e Internacional, em disputa do campeonato.